quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

A VIAGEM


A VIAGEM (Cloud Atlas)
David Arrais

         Os irmãos Wachowski ganharam sua merecida notoriedade depois de mudarem para sempre as produções de ficção científica com a trilogia Matrix. Desde então, diversificaram bastante suas produções, como V de Vingança e Speed Racer, voltando apenas agora ao gênero que os consagrou com A Viagem, tendo sido roteirizado e dirigido por Lana e Andy Wachowski e Tom Tykwer, a partir do livro de David Mitchell.

        Começando com um velho, com o rosto cheio de cicatrizes (Tom Hanks), contando uma história, o filme rapidamente se divide em 6 subtramas, cada uma em uma época e locais diferentes: no século XIX, 1936, 1973, 2144 e 2300, passando por EUA, Inglaterra, Escócia, Coréia do Sul.

Conhecemos, no meio do século XIX, Adam Ewing (Jim Sturgess), jovem advogado, casado com Tilda (Doona Bae), filha de Haskel Moore (Hugo Weaving, parceiro de longa data dos irmãos), que por sua vez é casado com Madame Horrox (Susan Sarandon) e grande amigo do Reverendo Giles Horrox (Hugh Grant). No ano de 1936, somos apresentados a Robert Frobisher (Bem Whishaw), um jovem músico homossexual, que tem um caso com Rufus Sixmith (James D’arcy) e sonha em trabalhar com Vyvyan Ayrs (Jim Broadbent), velho músico, casado com Jocasta Ayrs (Halle Berry) para compor a grande sinfonia Cloud Atlas. A medida que o tempo vai avançando, vamos conhecendo novas situações e passando por todas as épocas contempladas pelo história.

Extendendo a filosofia de boteco e encheção de linguiça a níveis estratosféricos, acompanhamos discussões complexas, como o tratamento às minorias (negros, homossexuais, idosos) e mazelas sociais paralelamente a discussões transcendentais (com a profundidade de um pires) sobre o sentido da vida e o papel de cada membro da sociedade e momentos cômicos, que, apesar de realmente divertidos, nada acrescentam à narrativa.

Algumas questões levantadas pelo filme nunca ficam bem explicadas. Sim, houve uma revolução, desencadeada por um abuso de um cliente a uma androide, mas nunca se sabe como ela atingiu tal escala e como gerou os resultados que vemos no futuro. A propósito, toda a sequência que envolve Jim Broadbent nos dias atuais é completamente desnecessária a trama, exceto pelo fato de vermos Hugo Weaving interpretando uma enfermeira grosseira e musculosa ou Tom Hanks como um arrogante e violento escritor. Desse modo, a constante alternância das tramas acaba se tornando por demais confusa, prejudicando a sua compreensão. 

Dito isto, é necessário enaltecer o brilhante trabalho da equipe de maquiagem de A Viagem. Em todas as subtramas, o elenco é o mesmo, ou seja, vemos Jim Sturgess e Hugh Grant, atores britânicos, interpretando coreanos, ao mesmo tempo em que temos Doona Bae, uma coreana, como uma aristocrata filha de um mercador de escravos americano.

Logicamente, o esmero visual não funcionaria não fossem ótimas atuações. Hugo Weaving se desdobra entre o demônio Old Georgie e o assassino de aluguel nos anos 70, ainda mantendo sua inflexão de voz marcante quando necessário, assim como Susan Sarandon, que vai de xamã do século XXIV ao papel de jovem senhora no século XXI com a mesma desenvoltura. Jim Sturgess mostra-se seguro em todos os seus momentos, e Jim Broadbent dá um show a parte, abusando de seu talento cômico, porém mostrando que também pode ser ameaçador quando preciso. Tom Hanks chega a ser caricato em vários momentos, mostrando que está se divertindo horrores com os truques visuais, mas mostra porque é um dos melhores atores de Hollywood nos últimos 30 anos, especialmente nas sequências no ano 2300. Mas a maior surpresa é Hugh Grant, esbanjando um talento surpreendente (talvez por estar fora de uma comédia romântica) em todos os seus personagens. Halle Berry não tem grandes momentos, mas atua em pé de igualdade com todos os outros.

Tecnicamente, como de costume nas produções dos irmãos, o filme é impecável, como efeitos visuais trabalhando alinhados com efeitos práticos e de maquiagem, sem nunca chamarem mais atenção do que o necessário, o que é sempre positivo. A fotografia mostra-se competente, conseguindo criar a atmosfera de cada época com perfeição, assim como a direção de arte riquíssima em detalhes, como nas lanchonetes sul-coreanas de 2144, as cabanas tribais de 2300 ou o navio negreiro do século XIX.

Talvez se não estivessem tão convencidos de sua grandiosidade e diminuíssem uns 40 minutos de projeção, os Irmãos Wachowski tivessem conseguido realizar outra obra prima. Infelizmente, fizeram um bom filme, mas enfadonho, confuso e pretensioso como a peça musical que lhe empresta o título durante a estória, cujo autor afirmou ser, a maior da história.
               
                

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