terça-feira, 24 de julho de 2012

O Palhaço

O PALHAÇO
David Arrais

          O Palhaço, segundo trabalho de Selton Mello como diretor, foi lançado em 2011, porém só agora tive a oportunidade de assisti-lo. É um roadmovie que mostra a história de uma trupe do circo Esperança, liderados por Benjamin, que interpreta o palhaço Pangaré, e seu pai, o palhaço Puro Sangue, e dono do circo.

Selton Mello mostra seu talento habitual, na construção do palhaço Benjamin como um homem triste, amargurado, a procura de algo que ele mesmo talvez não saiba o que é. Paulo José é um monstro da atuação, ao mesmo tempo alegrando e emocionando o espectador sempre que aparece e a jovem Larissa Manoela sempre encanta, intriga e emociona. 

Os personagens secundários também são cativantes, como o anão Meio Quilo, o casal de acrobatas (que frequentemente mudam de nacionalidade para atrair mais público), a senhora com seios imensos e os músicos, que sempre tentam ganhar um dinheirinho a mais.

Tecnicamente o filme beira a perfeição. Todas as cenas são extremamente bem executadas, como as sequências no interior do circo, com cores quentes, fortes, vibrantes, além da direção de arte que constrói com perfeição aquele ambiente peculiar, humilde, simples ou as cenas externas, com o uso tocante das cores da bandeira brasileira, sempre distribuídos equitativamente na tela.

Também são dignas dos maiores elogios a reconstrução das minúsculas cidades por onde o circo Esperança viaja, seja nas placas com erros de português, ou na pobreza extrema, infelizmente presentes em nosso país até hoje.

Outro aspecto a se salientar é a reconstrução de época, desde pequenos detalhes, como as cédulas de dinheiro, documentos de identidade, placas de veículos (as placas de veículos passaram ser na cor cinza apenas nos anos 90).

A trilha sonora também chama a atenção, com baluartes da música romântica/brega, como Odair José, Nelson Ned e Waldick Soriano, além de músicas com o tradicional ritmo das fanfarras circenses.

O que talvez seja o maior trunfo da produção são os personagens que aparecem e desaparecem durante o filme. O patrão piadista vivido por Jorge Loredo, Aldo, “da Aldo Auto Peças”, interpretado por Danton Mello (irmão de Selton), na cena definidora do personagem Benjamin, Tonico Pereira nos delicia com os mecânicos gêmeos, Emílio Orciollo Neto vive vendedor trambiqueiro e Jackson Antunes tem uma aparição relâmpago, porém protagoniza um dos diálogos mais marcantes.

No entanto, a grande cena é aquela com o monólogo de Moacyr Franco, que mostra o relacionamento de um delegado carrancudo com sua família. E seu gato.

Infelizmente, o filme possui alguns defeitos de linguagem e estrutura narrativa. Apesar de bem conectadas, as histórias acabam parecendo um amontoado de esquetes, com um tom episódico. Na cidade tal, acontece isso, isso e isso. Passamos pra seguinte. Agora acontece isso, isso e isso. Saem personagens tal, tal e tal e aparecem personagens tal, tal e tal.

Concluindo: O Palhaço é um filme bom? Sim, sem dúvida.  Recomendo que assistam? Sim. Não percam. Como não gostar de um fantástico estudo de personagens, conduzido magistralmente por um diretor quase estreante na função? Mas aí você vem com a pergunta fundamental. Gostou? Ao que prontamente respondo: Não. 

quinta-feira, 12 de julho de 2012

A Era do Gelo 4


A ERA DO GELO 4
David Arrais
                
        No cinema, as continuações tem sempre o grande problema de “concorrerem” com a produção original. É sempre necessário manter a personalidade dos personagens, mostrar o seu amadurecimento, além de adicionar novos personagens, porém apresentando novas situações para que exista identificação com o público, além de coesão entre os capítulos. Era do gelo 4 atinge esses objetivos.

A família de Sid o encontra, para lhe deixar responsável por sua avó, ligeiramente caduca, sempre a procura de sua mascote, pouco antes de um grande terremoto, causado pela separação dos continentes (a razão dessa separação é mostrada de forma hilariante). Assim, Manny, Diego e Sid, com sua avó, vão parar num iceberg, vagando pelo oceano, enquanto Elle, Amora (sua filha com Manny), Luis (um ouriço amigo de Amora) e os tios gambás, Crash e Eddie, ficam no continente.

Durante essa viagem no mar eles cruzam o caminho do ameaçador Capitão Entranha e sua tripulação pirata, composta por personagens pitorescos, entre eles a tigresa Shira, que logo desperta sentimentos em Diego.

Um dos pontos altos do roteiro é brincar com os estereótipos de temas náuticos, como sereias, duelos de espadas, sereias, abordagem de navios, além de elementos da própria saga, como na piada referente à aparição dos dinossauros no último filme, ou na explicação de porque Crash e Eddie não sentem medo. Outro acerto da trama é a citação de outros filmes, como o Senhor dos Anéis, Coração Valente, Apocalypse Now, chegando à introdução de músicas eruditas como Vivaldi, Mozart e Beethoven.

Assim como nos demais filmes, as maiores gargalhadas se dão com a constante busca de Scrat por sua noz. Mas não são as únicas. Sid e sua avó também protagonizam passagens engraçadíssimas.

A animação é mais uma vez impecável, melhorando sempre a cada episódio. As cenas em alto mar, inclusive durante uma tempestade, além da mobilidade dos personagens, que fazem várias acrobacias, beira a perfeição. Os efeitos 3D são bem eficientes, colaborando para o impacto emocional de algumas cenas. 

Mesmo com momentos de tensão, a história mantem sempre uma narrativa leve, com novos personagens bem mais cativantes que no anterior, também com uma trama mais coesa e bem armada. E claro, com um gancho para uma próxima aventura.

P.S.: A versão dublada, ao contrário do que eu esperava, é ótima. E vale a pena conferir os créditos finais.


Espetacular Homem Aranha





ESPETACULAR HOMEM-ARANHA
                                               David Arrais

                Em 2002, foi lançado Homem Aranha, de Sam Raimi, atingindo uma das maiores bilheterias da história e estabelecendo de vez as adaptações de quadrinhos como uma fonte de sucesso para o cinema. Porém, depois da bomba Homem Aranha 3, surgiu um problema: Como continuar as aventuras do super herói depois da morte de seu arquirrival, ainda mais em uma produção tão fraca?  A opção foi fazer um “reboot” da franquia.

                O filme faz um recorte temporal um pouco maior que os anteriores, mostrando o relacionamento de Peter Parker (Andrew Garfield) com seus pais, como foi adotado pelos tios Ben (Martin Sheen) e May (Sally Field) e seu relacionamento com Gwen Stacy (Emma Stone), como também o descobrimento de alguns fatos sobre o passado de seus pais e como Peter entra em contato com o renomado cientista Curt Connors (RhysIfans), obcecado por pesquisas sobre regeneração humana e que, por conta delas, acaba por se transformar no Lagarto.

A ideia foi boa, porém mal executada e com vários defeitos. No entanto, o maior deles não está nas atuações, escolhas dos atores ou efeitos visuais, nem mesmo na história, que até funcionaria, não fosse um pequeno detalhe: a franquia foi inaugurada há apenas 10 anos. A lembrança das aventuras estreladas por Tobey Maguire ainda estão muito frescas, o que torna as comparações inevitáveis.

                Apesar de contar com boas atuações, especialmente de Martin Sheen, Andrew Garfield e Rhys Ifans, desde o início é possível perceber a falta de química entre os atores, seja nas cenas de Peter com seus tios, ou de Gwen com seu pai, o Capitão de polícia George Stacy (Denis Leary).

A descoberta dos poderes é bem desenvolvida, como o sentido aranha, a sua força e reflexos (uma das melhores cenas ocorre nessa fase, dentro de um metrô), bem como a confecção do uniforme ou dos cartuchos de teia. Apesar do bom humor e ironia (característicos do herói) estarem presentes, o roteiro alterna bons e maus momentos na mesma proporção. O divertido diálogo entre Peter e um ladrão de carros, sobre o uso da máscara, é descartado pelo próprio desenvolvimento da história, com o excesso de vezes em que ele a “perde”.

Tecnicamente o filme é bem realizado. Tem um tom sombrio, com boa parte da trama se desenvolvendo em ambientes escuros, ou à noite. As sequências de ação são muito bem executadas, como aquela que se passa numa ponte, com a primeira aparição do Lagarto, e as cenas de luta bastante criativas. Os efeitos visuais são excelentes, especialmente as sequências em primeira pessoa, mostrando os voos do herói (únicos momentos em que o efeito 3D se mostra realmente necessário) e as transformações do Dr. Connors.

Mesmo não sendo grande fã dos primeiros filmes, os considero bastante divertidos e interessantes, especialmente Homem Aranha 2, com a presença de Alfred Molina. Funcionavam. O Espetacular Homem Aranha não funciona. Não engrena. Deixa sempre aquela sensação “Ei, já vi isso antes. Era realmente necessário fazer de novo?”.

quarta-feira, 4 de julho de 2012

Para Roma, com amor




PARA ROMA, COM AMOR
David Arrais

       As obras de Woody Allen sempre foram marcadas pela sua notória capacidade de observar o cotidiano das pessoas. A insegurança, a melancolia, a frustração, a sexualidade,  anseios e ambições das pessoas são temas sempre presentes em seus trabalhos. Neste ótimo “Para Roma, com Amor”, todos estes temas estão presentes de forma magistral.

Logo na primeira cena, é possível perceber “sim, este é um filme de Woody Allen”, com a quebra da quarta parede, quando o personagem fala diretamente com o público e nos apresenta a cidade e alguns dos personagens do filme. A partir daí, somos levados a um emocionante passeio pela cidade eterna, com seus monumentos históricos, como o Coliseu, a Fontana de Trevi ou a Piazza Di Spagna, sempre servindo de pano de fundo para o desenvolvimento de seus personagens. E que personagens!

            Sem nunca perder o ritmo, mesmo com algumas histórias que não se conectam,  vamos conhecendo todos eles, um a um, com todas as suas nuances e sutilezas. Milly e Antonio,um jovem casal em Lua de Mel que se envolve acidentalmente com Anna (Penelope Cruz), uma prostituta que confunde Antonio com um cliente, Halley (Alisson Pill),uma turista americana que se apaixona por Michelangelo(Flavio Parenti),  um jovem italiano, ao pedir informações, John (Jesse Eisenberg) e Sally (Greta Gerwig) um casal de estudantes que recebem a visita de Monica (Ellen Paige), uma jovem atriz amaericana que vai encontrar os amigos depois do fim de um relacionamento, o arquiteto Jack (Alec Baldwin)  que visita a cidade onde viveu 30 anos antes, e que conhece John ao visitar a rua onde viveu,e Jerry e Phyllis (Woody Allen e Judy Davis), pais de Halley, um casal de aposentados que viaja a Roma para conhecer a família do futuro genro, e Leopoldo (Roberto Benigni), um simples contador que tem sua vida mudada ao se tornar uma celebridade “instantânea” sem nenhum motivo aparente.

           O roteiro trabalha muito bem a construção dos personagens e a sua relação com a cidade, tais como: o trânsito caótico, o traçado urbano irregular e complexo de Roma que tornam quase impossível explicar a um viajante como chegar de uma região a outra. A rotina maçante do contador Leopoldo, acordando sempre na mesma hora, comendo o mesmo café da manhã e trabalhando todo dia em seu cubículo e sendo menosprezado por seus colegas de escritório. Ou a relação, ainda difícil, de Jerry, um produtor de óperas “à frente do seu tempo” com sua aposentadoria, ao perceber a possibilidade de “fugir” daquela situação ao ouvir o pai de Michelangelo cantando no banheiro. Aliás, é necessário enfatizar como Allen mostra-se talentoso para o humor (como de costume), mesmo sem dizer uma palavra em algumas cenas.

Além de Jerry, algumas das melhores cenas cômicas são protagonizadas por Emily, que se perde de seu marido durante a Lua de Mel e por Antonio, que precisa levar Anna a vários compromissos como sua verdadeira esposa.

Outro aspecto sempre presente nos personagens é a insegurança. Seja em Antonio, por ter que se mostrar competente e seguro em um encontro com parentes importantes da Capital, em Sally, visivelmente incomodada com a visita de sua amiga, Monica ou Giancarlo (Fabio Armiliato), pai de Michelangelo, um talentoso tenor, porém extremamente tímido. 

Existe ainda uma grande crítica social, baseada em Leopoldo: A necessidade da imprensa e do público de uma forma geral de criar celebridades “instantâneas”, mesmo sem nenhum motivo, ou nada que os faça merecer esse “título”.

Porém, quem rouba para si todos os holofotes sempre que aparece é Jack, desde o modo tocante como o arquiteto relata suas experiências da época em que lá viveu, aos momentos em que usa essas experiências, como uma consciência, quase como o grilo Falante do Pinóquio, para aconselhar o jovem John a resolver os problemas causados pela visita de Monica.

Com uma história bem amarrada, personagens cativantes e Roma sendo mostrada com uma belíssima fotografia, mais um grande filme de um grande realizador, que consegue a quase trinta anos, manter a incrível média de um filme por ano.